Na estreia da série “Scup Talks”, conversamos com Liz Heron (@lheron), diretora de Mídias Sociais e Engajamento no jornal The Wall Street Journal.
Liz, que fala conosco de Nova York, já foi editora de Mídias Sociais no The New York Times e trabalhou em importantes veículos de comunicação como ABC News e The Washington Post.
Via Skype, a jornalista nos conta um pouco sobre sua experiência com mídias sociais em veículos de imprensa, explicando por que participação, interatividade e produção colaborativa de notícias são uma parte cada vez mais estratégica do trabalho jornalístico.
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Scup: Liz, você tem uma grande experiência em trabalhar com mídias sociais em jornais importantes. Acho que a primeira coisa que todos nós nos perguntamos é se trabalhar com isso em uma empresa jornalística tem alguma especificidade. Como esse trabalho se diferencia do realizado em uma empresa comum?
Liz Heron: Bom, eu devo dizer que nunca trabalhei fora de empresas jornalísticas.  Então não tenho nenhuma experiência com mídias sociais em outro tipo de empresa. Mas o que imagino é que o tipo de trabalho que nós fazemos é muito amplo aqui na redação. Nós não procuramos necessariamente o que as pessoas estão falando sobre nós, o Wall Street Journal, embora isso seja parte do nosso monitoramento. Mas nós buscamos usar as mídias sociais como uma ferramenta para agregar notícias. Tudo que está acontecendo na esfera das mídias sociais, tudo que está espelhando o que é notícia… sabe, na vida real. É esse tipo de coisa que nós estamos procurando, para a qual queremos boas fontes, depoimentos de testemunhas oculares… pessoas que estão dentro das notícias, é isso que desejamos encontrar.
Scup: Nós todos sabemos que jornalismo social tem tudo a ver com pessoas. Como você avalia a contribuição dos leitores que vocês sempre recebem? Como eles ajudam vocês na produção de notícias?
L.H.: Bom, nós gostamos de pensar nos nossos leitores como nossas fontes também. Eles são nosso público mas, além disso, nos oferecem ideias interessantes para matérias, interagem com a gente. Eles até chegam a nos dizer se nós erramos na ortografia de alguma palavra, eles nos avisam muito rápido e nós os agradecemos. Mas, num nível mais amplo, nós estamos observando os assuntos de que eles falam o tempo todo. Se nós vemos algo “bombando” entre o nosso público nas mídias sociais, é provável que nós pensemos: “Ei, esse é um assunto que nós precisamos cobrir”, se ainda não estamos cobrindo. E, se estamos, nós devemos colocar lá e avisar as pessoas disso.
Scup: E, com toda essa riqueza, você acha que as empresas jornalísticas estão prestando atenção a isso? Elas estão observando e aproveitando ao máximo essas contribuições?
L.H.: Eu acho que elas são espertas! Sabe, mesmo há alguns anos e por muito tempo no passado, o relacionamento que as empresas jornalísticas tinham com os leitores era bem mais “broadcast”. Nós definíamos o que era notícia, escrevíamos, colocávamos em vídeo e entregávamos para você. Agora esse cálculo mudou completamente. Agora a conversa é bilateral. Nós estamos ouvindo o que os nossos leitores estão dizendo, estamos ouvindo toda a esfera de mídias sociais, mesmo quando ela não está falando com o Wall Street Journal. É bem mais um diálogo, eu diria.
Scup: E os jornalistas, em geral? Você acha que eles estão preparados para construir relacionamentos com as pessoas?
L.H.: Eu acho que a maioria está. Eu gosto de dizer para os jornalistas que eu estou treinando aqui no jornal que eles já têm todas as habilidades para fazer isso. É apenas um novo “kit de ferramentas”. Eles são escritores, sabem como escrever um bom “lead” e então sabem como escrever um “tweet”, como ser sucintos e dizer algo interessante. Eles têm uma longa experiência profissional em geral e sabem acrescentar um bom contexto a uma história que pode ter começado um tanto efêmera na Internet. São pessoas curiosas, que gostam de conversar com gente… e todas essas são habilidades e atributos muito úteis para o trabalho com mídias sociais.
Scup: No Brasil, a maioria das empresas jornalísticas não está de fato prestando atenção a isso. Na verdade, elas raramente usam mídias sociais em suas narrativas, em suas narrativas jornalísticas. Em parte, é porque elas acham que mídias sociais são menos importantes. Elas ainda acham. E, portanto, os investimentos ainda não são tão altos. Então eu gostaria de saber de você, isso acontece apenas no Brasil? E, além disso, você acha que as redações americanas já “passaram dessa fase”? Se isso pode ser chamado de fase. Elas já superaram isso?
L.H.: Bom, em primeiro lugar, isso me surpreende sobre o Brasil. De tudo que eu já ouvi falar, é um dos países mais presentes em mídias sociais, conversando sobre diferentes assuntos. Então, se eu fosse jornalista aí, eu definitivamente estaria prestando atenção em mídias sociais como um modo de conseguir ideias para reportagens, interagir com as pessoas e encontrar fontes. Eu acho que as redações americanas ainda estão passando por essa fase. Mídias sociais ainda são muito novas. Só faz alguns poucos anos que existem pessoas dedicadas a esse tipo de coisa numa redação. Nós ainda estamos tentando descobrir qual é o melhor jeito de usá-las e quantos recursos são necessários. Mas eu acho que é algo para monitorar constantemente. Um equívoco comum é que as mídias sociais e a Internet em geral são uma massa indiferenciada de pessoas anônimas, não é? E isso não é verdade. Políticos, pessoas públicas, celebridades, outros jornalistas, os seus concorrentes, eles estão todos lá, nas mídias sociais. Essas são as pessoas com quem você já está interagindo de variadas formas, como jornalista. Por isso, faz sentido acompanhar as mídias sociais também.
Scup: Agora vamos mudar de assunto um pouco. Todos nós sabemos que trabalhar com mídias sociais exige muito esforço, pelo volume de informações. As pessoas que trabalham com isso já estão acostumadas. Por outro lado, eu gostaria de saber o que facilita esse trabalho em termos operacionais. Isto é, como vocês monitoram mídias sociais no Wall Street Journal?
L.H.: Bom, aqui no jornal nós temos a sorte de ter uma equipe de seis pessoas trabalhando com mídias sociais e engajamento, o que é bastante para uma redação. Isso ajuda a estar presente em todas essas plataformas e conversas que estão acontecendo simultaneamente. Mas eu acho que  mesmo redações menores e mesmo uma única pessoa podem fazer um bom trabalho. Nós temos um time de seis pessoas, nós criamos conteúdo para as nossas plataformas em mídias sociais. Nós somos jornalistas, escrevemos, fazemos vídeos, trabalhamos com a comunidade do website, ou seja, trabalhamos com os comentários, interagimos com as pessoas em vários lugares. E esse é o nosso trabalho exclusivo, isto é, que nos concentremos em comunidade, engajamento e mídias sociais para a redação.
Parte do trabalho é usar certas ferramentas. Nós usamos algo chamado “Social Flow”, que nos ajuda a acompanhar e organizar a nossa audiência e o que as pessoas que nos seguem nas mídias sociais estão dizendo. Nós todos também nos esforçamos para conquistar fontes em mídias sociais. Da mesma maneira como os jornalistas costumavam fazer em outros contextos, nós tentamos fazer o mesmo no contexto das mídias sociais. É muito importante seguir pessoas que têm um bom histórico de ter alertado você sobre “o que importa saber hoje do Twitter”. Então, uma vez que você tenha se esforçado para encontrar essas pessoas em cada plataforma, isso vai ser útil para economizar parte do tempo que se levaria para encontrar as informações essenciais e que realmente importam.
Scup: Agora vamos falar de política, porque eu sei que você tem feito a cobertura disso. O que nós queríamos saber é o que você acha desta cobertura das eleições nas mídias sociais em comparação com 2008.
L.H.: A esfera política mudou completamente desde 2008, e as mídias sociais são uma das maiores transformações. Em 2008, o Twitter mal estava no “radar”, o Facebook era bem mais uma rede mais pessoal na qual somente se interagia mesmo com amigos e família, e não realmente com o público em geral e muito menos com políticos. Entre essas mudanças, uma das mais interessantes é que os políticos se abriram para as mídias sociais estrategicamente. Agora eles estão realmente tentando transmitir mensagens, fazendo entrevistas e ações em mídias sociais, eles estão comprando anúncios em lugares como o Twitter com um alvo bem definido e específico. Então eu acho que esta é definitivamente uma eleição muito maissocial do que a de 2008.
Scup: Agora, para terminar, vamos falar sobre o futuro. Você acha que o diretor de mídias sociais ou editor de mídias sociais, a área de mídias sociais em uma redação vai continuar a existir no futuro? Ou os jornalistas vão começar a ter isso adaptado à rotina deles? Vai existir uma redação social? É isso que eu quero dizer.
L.H.: Atualmente eu acho que é muito importante ter pessoas dedicadas às mídias sociais em redações. E isso é porque as redações em geral ainda não são muito “sociais”. Mas eu realmente acredito que, no futuro, vai ser parte do trabalho de todo mundo compreender mídias sociais e usá-las de diversas formas para alcançar novos públicos, realizar as suas tarefas, encontrar novas fontes… Isso vai se tornar parte do DNA de uma redação assim como a web se tornou. Costumavam existir muitas redações em que o jornal impresso ou a TV eram separados do website, e esse não é mais o caso. Então eu prevejo que as mídias sociais irão pelo mesmo caminho.